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1 19/06/2019 14:03

O título deste artigo, de forma proposital, tece a diferença de intenções, do bem e do mal, entre a obra literária do escritor português Júlio Dinis, As Pupilas do Senhor Reitor, com a atual administração municipal de Canavieiras. Se no livro português a trama é baseada em amores e desencontros entre pessoas de duas famílias, em Canavieiras, o desencontro é causado pela quebra das expectativas de grande parte da população.

Se no livro aparece a figura de um reitor para tutelar as duas moças órfãs, em Canavieiras a Câmara de Vereadores tem a obrigação formal de tutelar os seus munícipes diante dos grandes escândalos que surgem à tona como muita constância. Diferente do reitor, um santo homem religioso, nossos edis são políticos e como tais são movidos por interesses dos mais diversos.

Diversos por representar parcelas da sociedade que o elegeram, por entenderem que cuidariam dos interesses comuns, que normalmente são chamados de bancadas, sempre acompanhadas de termo aplicado para designar os interesses que defendem. Esses interesses podem ser o mais legítimos, ou não, a depender dos benefícios que porventura poderão trazer à maioria da população.

Dentre as bancadas de quaisquer legislativos, duas são as mais conhecidas, a de oposição e da situação ao poder executivo, formada por integrantes dos partidos que se coligaram nas eleições. Se antes a agremiação política era o norteador do posicionamento, hoje os motivos são os mais díspares possíveis, que começam com uma troca de favores, o chamado toma lá dá cá.

Essa prática – considerada nociva e prejudicial à população –, altera o comportamento dos parlamentares, cujas bancadas são flutuantes, e anda à deriva, aportando nos píeres que lhes são mais favoráveis, momentaneamente. E assim procedem com a maior sem cerimônia e tranquilidade como se após a eleição fossem rompidos todos os elos com os eleitores que sufragaram os votos necessários para que sentassem naquelas cadeiras.

Em Canavieiras a situação não destoa de outros municípios e as bancadas não podem ser mensuradas de forma permanente, pois variam como as marés, cheias ou vazias, com ondas altas e baixas. E sabe quem provoca esse fenômeno: os interesses do poder executivo, e não a força da lua ou a força do vento. Tem que chame esse fenômeno de Bolsa de Valores, como o vereador canavieirense Diego de Jesus (Caboclo).

E como o preço da democracia é a eterna vigilância, alguns vereadores canavieirenses, diariamente, contam e recontam suas bancadas, cujo produto da soma variam, não pelos conceitos matemáticos, mas por promessas e favores. E a eterna vigilância tem aumentado após as notícias de bastidores darem conta do passeio de um advogado na praça da Bandeira transportando uma famosa “mala preta”.

Necessariamente, o conteúdo da mala não é físico, tangível, tipo aqueles fabricados na Casa da Moeda, mas também oferecidos via conversa telefônica, redes sociais, num desprezo à vigilância dos órgãos de segurança e Ministério Público. O que digo aqui ouvi numa das sessões (ou várias) da Câmara de Vereadores, portanto, vendidas pelo mesmo preço de compra, sem lucro algum.

Mas nenhuma conversa, por mais que seja considerada fofoca, não nasce do além, do etéreo, e sim de algum ato e fato, como diz uma das leis da física: para cada ação há uma reação em contrário. No entender dos nobres edis, os depoimentos tomados pela Comissão Parlamentar Processante (CPP) da CPI do Lixão teria sido o ponto de partida, a ação, cuja reação seria resguardar o mandato do executivo.

E o receio tem lá seus fundamentos, tendo em vista as disparidades e desencontros dos depoimentos prestados por um empresário, ex-secretário, atuais secretários e ex-chefe de departamento. As contradições evidenciaram, salvo melhor juízo, o núcleo duro do poder na Prefeitura de Canavieiras, os superpoderes, os beneficiados, e o calcanhar de Aquiles da gestão, o setor de licitação e medição das execuções dos serviços.

Pelo que ficou evidenciado – e gravado nos depoimentos – um chefe de departamento mandava no outro departamento, cujo chefe acatava suas ordens, bem como o secretário, superior hierárquico. Está lá nos anais da Câmara, Clery é quem sabe, Clery é quem manda, Clery é quem salva! Nem mesmo respeitava seu superior hierárquico, apesar de ter Guerra no nome.

E o todo-poderoso Clery, tido e havido como da extrema confiança do prefeito, daqueles que podem ser chamados de gente da sua cozinha, dada a intimidade anterior e atual, foi obrigado a descer do seu pedestal e se comportar como um simples mortal num tribunal político. Demonstrou sua fragilidade profissional, ficou patente o seu desconhecimento sobre terraplanagem, sua falta de intimidade com tratores.

Não conseguiu distinguir um ripper de escarificador e chegou a afirmar que um desses teria uma concha, para o deleite e galhofa dos presentes à audiência. Afirmou o que não sabia, mesmo tendo ouvido que mentira tem pernas curtas, o que deverá ser comprovada em acareação com ex-colegas de trabalho, proprietários de fazendas. É nesse momento que a cautela, a discrição se mostra melhor e mais apropriada que a arrogância.

Mas a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI do Lixão), a Comissão Parlamentar Processante (CPP) não chegou ao fim, muitos depoimentos estão por vir, o (ou os) relatório a ser elaborado e, por conseguinte, ser votado. Muita água ainda deverá passar por baixo da ponte, quando então a população poderá ter convicção se realmente foram cometidos os desvios contidos na denúncia.

Mas como disse no início, se não pudermos contar com a Câmara de Vereadores para desempenhar o papel do reitor na defender suas pupilas – a população de Canavieiras –, resta o consolo de que, ainda, o eleitor canavieirense poderá contar com o Ministério Público e o Poder Judiciário para se defender dos pupilos do senhor gestor. Se é que teremos um final feliz, como no romance.

*Radialista, jornalista e advogado


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